Pinte menos, leia mais

A nova moda no mercado literário são livros que têm palavras só na capa. Em suas páginas, desenhos psicodélicos diversos esperam para ser coloridos pelos leitores-artistas. São mandalas, jardins, formas abstratas, animais, zumbis e até nudes. Quem compra esse tipo de livro terá pela frente muitas e muitas horas de lazer e relaxamento pintando as páginas. São livros de colorir. Mas “para adultos”.
Logo antes desta moda, surgiram os livros DIY, interativos, tipo “Destrua Este Diário”. Obras que venderam como água, e que ganharam minha desconfiança, não apenas porque não gosto de escrever em páginas de livros. Pense bem: que esforço mental foi feito pelos “autores” destes livros, que certamente ganharam uma pequena fortuna? Eles não precisaram desenvolver personagens, passar noites em claro costurando o enredo e sequer pesquisaram para evitar anacronismos. Tiveram criatividade para criar listinhas e tarefas lúdicas, mas nem um décimo do trabalho dos escritores de verdade, que botam todos os neurônios para funcionar para criar uma história cativante e verossímil (porque até histórias fantásticas precisam de um pouquinho de verdade para que os leitores acreditem nelas).
Entendo a onda de livros interativos em que os leitores terminam a trama ou alteram o destino dos personagens. Quem nunca quis mudar o rumo de uma história que está lendo? Agora o leitor pode! O autor deixa parte do seu trabalho na mão de quem lê, e ainda lucra pra caramba!
Chiclete colado no livro? Deus me livre!
Agora, os livros de colorir “para adultos”: admiro a habilidade de quem faz os desenhos elaborados a serem coloridos. Não tenho facilidade para desenhar, e criar uma mandala de qualquer jeito à mão livre ou com compasso, me exigiria sangue, suor e com certeza lágrimas. Acontece que estes livros de colorir estão sendo vendidos como “anti-estresse”, quando na verdade estão apenas tornando aceitável que adultos façam uma atividade que era restrita às crianças. Como muitas pessoas fizeram questão de lembrar nas redes sociais, os livros de colorir “para adultos” nada mais são que Almanaques da Turma da Mônica que passaram pelo raio gourmetizador.
Como a galinha sairia do raio gourmetizador?
Sabe o que também é capaz de nos fazer relaxar? Livros convencionais, que têm contos, crônicas, poemas e histórias com começo, meio e fim. Há livros mais complexos e livros mais simples, ideais para serem lidos em momentos de descanso e lazer. E sabe o que mais? Os livros de colorir podem ser usados uma única vez, limar o estresse em uma única ocasião, enquanto o bom e velho livro convencional sempre estará lá à sua disposição, pronto para ser relido e para lhe proporcionar surpresas e alegrias que você tinha esquecido com o tempo.

Um livro interativo ou um livro de colorir não se compara a um livro quase pronto (afinal, em qualquer literatura há certo protagonismo do leitor, que cria as cenas e os personagens em sua mente com liberdade) e cheio de letras, sem qualquer resquício de lápis de cor ou giz de cera. Os autores tiveram um trabalhão para colocar aquela história, redondinha, bonitinha, emocionante, ali no papel para você. Trabalho que não se compara ao dos criadores de listas, brainstormers de tarefas inusitadas e desenhistas de jardins cheios de detalhes. Livros participativos e de colorir “para adultos” são moda passageira. O livro de verdade está aí há milhares de anos, e veio para ficar. 

Comentários

  1. De verdade? Não vejo muita graça em livros assim, eu tenho Destrua esse diário faz um ano e nunca estraguei o coitado. Porém acho esse tipo de livro criativo, mas definitivamente eles não são pra mim. http://luxuosoestilo.blogspot.com.br/

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  2. Eu compartilho da mesma opinião que você, acho que um livro 'de verdade' relaxa muito mais e ainda acrescenta coisas à sua vida!
    Eu tenho o Destrua esse Diário e no começo fiquei super empolgada, mas agora, mal pego nele :/
    Mas respeito quem gosta, tem gosto pra tudo, né?! :P

    Beijos
    Colecionando Primaveras
    PS: Tá rolando Sorteio de livros lá no Blog, participa!

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